Monday, September 26, 2005

Nossa Senhora da Natividade

E é isto: acabaram-se as festas de Verão, acabou-se o Verão. Mas hoje está um dia de Verão. Na vila não há mais festas, a não ser o S. Martinho, profana totalmente mas com o aval do santo, vão se lá perceber os eleitos de Deus. Nossa Senhora da Natividade encerrou o calendário. Já vos devo ter falado vezes sem conta da festinha de Nossa Senhora da Natividade na rua onde morei para aí entre os três e os oito anos, entre 1964 e 1969. Mas repiso só para me inflamar a saudade. Um tipo aos quarenta já começa a tornar-se quase morbidamente saudoso.
Era ainda uma ruinha de terra, não que fosse grande novidade numa época em que quase todas as artérias eram de terra batida. E uma ruinha, se formos considerar apenas o troço entre o canto da balança e a mercearia que hoje é a loja do Gil, a zona onde eu morava na casa logo a seguir à ermidinha de Nossa Senhora da Natividade e a cujas obras, impulsionadas pelo Padre Lucindo Andrade, que lhe quiseram restituir a dignidade doutros tempos, assisti. A partir dessas obras a ermida adquiriu vida e eu como o balcão da minha casa dava para o sino fui incumbido de tocá-lo algumas vezes. Não me lembro se alguma vez na vida pensei em seguir a vida religiosa, mas se isso tiver acontecido, só pode ter sido nessa altura.
Na rua viviam pessoas de quem ainda me lembro como os "Saquinhas". Ainda lá está a Natividade, filha do ti João "Saquinha" Mota. O ti João que me levava a passear na sua burrinha. A Margarida que vive no estrangeiro e que cumprimentei o ano passado a Madalena que já faleceu, o João, o Antonino, fadista nos Estados Unidos e o José que constrói e toca instrumentos de cordas no Canadá e que entrevistei num destes dias. Como os Tobias, ainda vivem na rua a Fátima e o Eduardo com quem me lembro de brincar em criança, filhos do sr. Tobias que era barbeiro. A minha avó Teresa de Jesus Alves e o meu Avô Manuel de Sousa Dias (mestre Manuel da Guerra) já falecidos, que "faziam"o S. João, padroeiro dos pedreiros que saía todos os anos na procissão de S. Miguel. Os Pachecos, o sr. Pacheco que trabalhava na Casa do Povo e a sra. Lurdes que se trataram com os meus avós por "vezinhos" até ao fim da vida, ainda que já não o fossem, a Lúcia que revi este Verão, sobrinha da Sra. Lurdes, ao tempo uma moça casadoira e hoje já avó e que vivia lá em casa e finalmente os meus pais e a minha irmã.
O fluir do tempo atrai-me e emociona-me. Estou a ver o padre Lucindo a construir uma lapinha pelo S. João à frente da ermida. Há uma fotografia algures com a lapinha. Vou publicá-la aqui. E lembro-me da festa. Engalanava-se a rua com bandeirinhas de papel e luzes que me lembre era luxo proibido e a banda da música, fazia do nosso balcão o coreto. Os músicos trepavam para ali com uma escadinha e toca a tocar. E eu todo orgulhoso com as atenções voltadas para o meu balcão. Podem ter sido os primórdios da minha atracção pelos palcos.
Em suma, era uma festa caseira. Feita por quem vivia ali para quem ali vivia. Como se fosse uma celebração familiar.
Desde há poucos anos depois dum interregno um grupo de amigos voltou a fazer a festa de Nossa Senhora da Natividade. Ainda bem.

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